por Fabricio Vieira, facilitador de aprendizagem e fundador da Casa Movere
Em um mundo que valoriza tanto a inovação, por que insistimos em associar juventude à criatividade e maturidade à obsolescência?
Tenho refletido sobre isso cada vez mais — nas reuniões de consultoria, nas conversas com colegas, nas análises de cultura organizacional que realizo. Existe um padrão silencioso que exclui profissionais com mais de 60 anos do centro das decisões, como se a experiência fosse algo que atrasa, e não algo que orienta.
A verdade é que os estereótipos sobre envelhecimento no trabalho estão por toda parte. Quantas vezes você já ouviu, ou até pensou sem perceber, que alguém “já devia estar se aposentando”, que “não vai acompanhar o ritmo”, ou que “não se adapta a novas tecnologias”? Essas frases, muitas vezes ditas sem maldade, refletem vieses inconscientes que moldam contratações, promoções e a própria forma como olhamos para o potencial humano. E isso precisa mudar.
De acordo com o relatório “Longevity and the Future of Work” da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), pessoas acima de 55 anos já representam mais de 20% da força de trabalho nos países membros da organização — e esse número só tende a crescer. No Brasil, dados do IBGE apontam que a população com 60 anos ou mais já ultrapassa os 32 milhões de pessoas, sendo que muitos continuam ativos, produtivos e, principalmente, desejando contribuir.
Mas vamos além dos dados demográficos. Falo de valor. De impacto. Nos Estados Unidos, a AARP Foundation — braço social da AARP, a maior organização voltada ao bem-estar e à inclusão de pessoas com 50 anos ou mais — tem evidenciado que equipes intergeracionais são mais inovadoras, mais coesas e entregam melhores resultados. A diversidade de idade amplia repertórios, melhora a tomada de decisão e fortalece a cultura organizacional. Esses achados conversam com o que também vem sendo observado em outras partes do mundo: uma pesquisa conduzida pela Boston Consulting Group revelou que empresas com diversidade etária têm 19% mais chances de serem inovadoras.
Ainda assim, uma pesquisa da PwC mostrou que apenas 8% das empresas globais têm estratégias formais para atrair ou reter talentos sêniores. É como se estivéssemos jogando fora justamente o que temos de mais raro: tempo vivido, sabedoria aplicada, inteligência emocional forjada por décadas de prática. E veja — não estou dizendo que toda pessoa madura é automaticamente sábia ou brilhante. Mas estou dizendo que ela pode ser, e que muitas vezes é. E que não reconhecer isso é uma perda para todos.
Já vi — e sei que você também já viu — histórias inspiradoras. Imagine uma profissional de 63 anos assumindo a liderança de um projeto internacional de transformação digital. Ou um consultor de 68 anos ajudando a resolver um conflito complexo entre áreas — não com ferramentas mirabolantes, mas com escuta, paciência e autoridade construída ao longo de décadas. Esses exemplos, ainda que hipotéticos, são totalmente possíveis e representam o que vemos acontecer quando a maturidade encontra espaço para florescer. Não é a idade que faz a diferença. É a trajetória. E o espaço que se oferece para que ela possa atuar com potência.
Por isso, quero deixar um convite. Aliás, um desafio: que tal rever os critérios com os quais você — e sua empresa — definem o que é “talento”? Que tal incluir a maturidade como uma dimensão da diversidade? Que tal olhar para um currículo extenso e enxergar não um passado que já passou, mas um presente cheio de possibilidades?
Valorizar quem tem mais de 60 anos não é apenas uma questão de justiça social. É estratégia. É inteligência de negócio. É humanidade.
Que mais empresas tenham coragem de reconhecer a força da experiência. Que saibamos construir ambientes em que ninguém precise disfarçar sua idade para ser aceito — e onde cada ruga seja vista como o que realmente é: sinal de presença, de tempo, de entrega.
Se você acredita nisso, compartilhe. E se ainda não acredita, convido você a olhar de novo. Talvez seja hora de escutar quem tem muito a dizer — e tempo de sobra para contribuir.
Fontes: https://www.oecd.org/en/publications/working-better-with-age_c4d4f66a-en.html
https://www.bcg.com/publications/2018/how-diverse-leadership-teams-boost-innovation
https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/38186-censo-2022-numero-de-pessoas-com-65-anos-ou-mais-de-idade-cresceu-57-4-em-12-anos
https://www.pwc.com/gx/en/services/people-organisation/workforce-of-the-future/workforce-of-the-future-the-competing-forces-shaping-2030-pwc.pdf
https://www.aarp.org/work/employers/age-diversity-value
Fabricio Vieira é facilitador de aprendizagem, consultor de Recursos Humanos, coach certificado pela Escola de Coaches da EcoSocial e fundador da Casa Movere. Além de sua graduação em Tecnologia da Informação pela Universidade de Marília e de um MBA em Administração Estratégica de Empresas pela UNIBTA, atualmente, está cursando uma segunda graduação em Psicologia pela UNIP.