por Fabricio Vieira, fundador da Casa Movere
Voltar a ler um relatório da Korn Ferry, onde trabalhei por anos, sempre me provoca. O Workforce 2025 não foi diferente. Ao longo de suas páginas, fui encontrando dados, mas também angústias, deslocamentos e uma série de perguntas que ainda estamos aprendendo a formular. Não é só um estudo sobre tendências. É um retrato das fraturas (e possibilidades) do mundo do trabalho hoje.
Cinco pontos se destacaram, e todos me parecem atravessados por uma disputa central: quem define o que é “trabalhar bem”?
O primeiro deles é o esvaziamento dos níveis médios de gestão. Em nome da eficiência, muitas empresas vêm cortando gerentes. Mas, segundo a pesquisa, 43% dos colaboradores dizem que seus líderes não estão alinhados e 37% se sentem sem direção desde que essas funções desapareceram. É fácil pensar que gerentes são peças substituíveis. Difícil é lidar com a desorganização emocional e estratégica que essa ausência produz. O resultado? Executivos sobrecarregados, lideranças inseguras, perda de confiança e queda na produtividade.
O segundo ponto é a pressão financeira. O custo de vida subiu, mas os salários não acompanharam. Sete em cada dez profissionais sentem que o que recebem já não cobre suas necessidades. Mais de um terço acredita que ganha menos do que vale. Apesar disso, apenas 10% estão se candidatando ativamente a novas vagas. A mensagem é clara: as pessoas querem estabilidade, mas estão no limite. Permanecem porque precisam, não porque acreditam. Esse tipo de permanência cobra caro da saúde, da cultura e da inovação.
O terceiro achado é a urgência da inteligência artificial. O Brasil aparece entre os países com maior otimismo e preparo para a adoção de IA no trabalho. Cerca de 80% dos profissionais por aqui dizem receber treinamento sólido, contra menos da metade nos Estados Unidos, Japão e parte da Europa. Isso é raro. Ainda assim, há uma desconexão importante: enquanto 78% dos líderes afirmam já ter compreendido como usar IA de forma eficaz, apenas 39% dos trabalhadores concordam. É como se estivéssemos empolgados demais com a ferramenta e atentos de menos a como ela, de fato, é vivida no cotidiano.
O quarto ponto é o impasse do modelo híbrido. Enquanto 59% das pessoas estão em trabalho 100% presencial, apenas 19% dizem preferir esse formato. No Brasil, o número é ainda mais gritante: só 12% estão felizes com a volta ao escritório em tempo integral. O desejo predominante é por modelos híbridos mais flexíveis, mas isso esbarra em políticas padronizadas que não consideram as realidades locais, culturais e afetivas de cada time. Resultado: cresce o ressentimento, diminui o engajamento.
Por fim, o relatório escancara uma tensão geracional importante. Baby boomers tendem a achar que tudo está bem. A Geração Z discorda. Enquanto 45% dos profissionais mais velhos dizem que não há conflito entre gerações, só 17% dos mais jovens compartilham essa visão. Para metade da Geração Z, a comunicação entre as gerações é falha. Para 40%, há um abismo digital. Não basta colocar cinco gerações no mesmo time. É preciso ouvidos atentos, formação e disposição para lidar com a diferença.
O Workforce 2025 é um chamado. Não apenas para pensar o que fazer com os talentos, mas para perguntar, com mais cuidado e menos pressa, o que os talentos estão tentando dizer. Eles falam quando pedem por mais direção, por salários mais justos, por autonomia, por inclusão verdadeira. Eles falam quando querem um trabalho que caiba numa vida, e não o contrário. Fica o convite à escuta.
Fonte: Korn Ferry. Workforce 2025. Mudanças de poder.
Disponível em: https://www.kornferry.com/insights/this-week-in-leadership/workforce-2025-report
Fabricio Vieira é facilitador de aprendizagem, consultor de Recursos Humanos, coach certificado pela Escola de Coaches da EcoSocial e fundador da Casa Movere. Além de sua graduação em Tecnologia da Informação pela Universidade de Marília e de um MBA em Administração Estratégica de Empresas pela UNIBTA, atualmente, está cursando uma segunda graduação em Psicologia pela UNIP.