por Fabricio Vieira, fundador da Casa Movere
“Está na luta, no corre-corre, no dia a dia
Marmita é fria, mas se precisa ir trabalhar
Essa rotina em toda firma começa às sete da manhã
Patrão reclama e manda embora quem atrasar”Seu Jorge, 2007
Existem lugares que nos transformam sem que a gente perceba. O trabalho é um deles. A maioria de nós chega ao primeiro emprego com uma mala cheia de sonhos, medos e perguntas que ainda não sabem o caminho. E, pouco a pouco, as experiências que vivemos dentro desses espaços começam a desenhar quem somos e quem seremos.
Trabalhar é muito mais do que realizar tarefas. É se encontrar e, às vezes, se perder. É construir uma imagem de si diante dos outros, é experimentar limites, é descobrir o que se quer sustentar e o que se precisa abandonar. Cada reunião, cada troca de ideias, cada desafio superado ou não vencido vai, silenciosamente, moldando nossas maneiras de existir no mundo. Nos tornamos, ali, não apenas profissionais, mas pessoas que aprendem, que se curvam, que resistem, que florescem.
O ambiente em que essas vivências acontecem faz toda a diferença. Quando uma organização cultiva a escuta verdadeira, o respeito pela diversidade de modos de ser e o incentivo ao crescimento genuíno, ela oferece um solo fértil para que a subjetividade possa se expressar com inteireza. As diferenças deixam de ser obstáculos e passam a ser fontes de criação, de sentido e de pertencimento. A cultura organizacional, então, deixa de ser uma moldura rígida e se torna um campo aberto, onde cada um pode caminhar sem precisar ferir suas próprias raízes.
Mas também há espaços que sufocam. Onde o medo de errar fala mais alto que a coragem de tentar, onde o desempenho é cobrado sem que se olhe para as pessoas por trás dos números. Nesses ambientes, a subjetividade pode se encolher, esconder suas cores, se esquecer de que existe algo único em cada trajetória. Nessas horas, o trabalho não apenas não ajuda a construir quem somos — ele pode nos afastar de nós mesmos.
É bonito pensar que o trabalho, quando respeita a vida como ela é, pode ser um grande aliado na jornada de se tornar quem se é. Mais do que resultados, metas e processos, o que realmente fica são as marcas sutis que essas vivências deixam no nosso modo de olhar, de escutar, de sonhar o futuro.
Talvez o maior desafio das organizações seja justamente este: criar culturas onde caibam muitos jeitos de ser. Onde não seja preciso se disfarçar para pertencer. Onde crescer profissionalmente seja também crescer humanamente. Onde o trabalho não roube a vida, mas a enriqueça.
No fim, é no convívio cotidiano, nas escolhas silenciosas e nos encontros inesperados que vamos tecendo nossa história. O trabalho é só um cenário? Talvez. Mas é, acima de tudo, um espaço vivo, pulsante, onde vamos esculpindo, dia após dia, a resposta para uma pergunta que nunca se cala: quem estou me tornando?
Fabricio Vieira é facilitador de aprendizagem, consultor de Recursos Humanos, coach certificado pela Escola de Coaches da EcoSocial e fundador da Casa Movere. Além de sua graduação em Tecnologia da Informação pela Universidade de Marília e de um MBA em Administração Estratégica de Empresas pela UNIBTA, atualmente, está cursando uma segunda graduação em Psicologia pela UNIP.