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por Fabricio Vieira, facilitador de aprendizagem e fundador da Casa Movere 

Como é complexo falar do simples ato de se comunicar. Desde bebês somos inseridos nesse jogo da linguagem, nessa interatividade intensa com a vida, na escola, no trabalho sem a consciência de que estamos desenhando uma trajetória onde não há rascunho, tudo fica, tudo marca, se transforma para o bem e para o mal. A forma como ouvimos e falamos, nosso tom de voz, um olhar maroto, até o silêncio, são resultados dessas heranças afetivas.  

Estamos tão imersos na forma como aprendemos a nos expressar, que pouco nos questionamos sobre como ela afeta o outro. E nessa falta de percepção, muitas vezes nascem os conflitos. Nos sentimos mal-entendidos, sofremos, evitamos pessoas, nos frustramos com o que não conseguimos realizar. “Como aquela pessoa não consegue me entender?”, nos perguntamos. Levante a mão quem nunca passou por momentos dolorosos de angústia, insônia ou irritação por uma conversa malsucedida na família, no trabalho, com a pessoa amada.  

Nos sentimos violentados emocionalmente.  

O psicólogo Marshall Rosenberg era orientador educacional nos Estados Unidos e viveu essa violência verbal nos anos 60, um período tenso, com o forte movimento dos negros pelos direitos civis. Quando as primeiras escolas e universidades começaram a abandonar a segregação racial, Rosenberg trabalhou como mediador entre esses grupos para construir uma convivência pacífica. Essa experiência se transformou uma metodologia que se espalhou pelo mundo, por sua eficiência, a Comunicação Não Violenta, hoje muito conhecida pela sigla CNV. 

Não se trata de uma técnica. A CNV é um exercício permanente de olhar o mundo e se relacionar com as pessoas. Uma obra que vale a pena ler, reler, consultar e assimilar para toda e qualquer situação de conflito. E desde já, por uma questão de honestidade, será impossível abordá-la com justiça em poucos parágrafos, mas fica aqui meu esforço para que você mergulhe nesse aprendizado, trazendo mais preparo para lidar com momento difíceis nos vários âmbitos da sua vida. 

Uma das premissas da CNV é a compaixão. Parte do princípio que é preciso ouvir o outro profundamente, de forma aberta e generosa, sobre os motivos de sua insatisfação. Compreender seus sentimentos, sua conduta, sem julgamento. Como se cada ser humano fosse um prisma, e nesse jogo de espelhos, desenhos diferentes se configurassem, nem sempre como os nossos. Estão ali os valores, experiências de vida, bem e malsucedidas que deixaram atitudes e formas de se comunicar, nem sempre conscientes.  

Depois do ouvir, falar, se abrir, mostrar sua vulnerabilidade, onde se sentiu magoado, com a mesma generosidade com seu interlocutor. Exercer também a autocompaixão. É nessa abertura mútua, segundo Marshall, que a comunicação se realizará, com entrega, desapego, deixando a vaidade e a convicção “que tem a razão”, de lado.  

Não por acaso, Marshall escolheu a girafa como símbolo da CNV. Com seu pescoço longo, sua forma de contemplar o mundo do alto com olhar sereno, é o mamífero que tem o maior coração, 43 vezes maior do que o humano. Sua língua grossa é capaz de comer plantas espinhosas, uma metáfora para conversas afiadas. Vivemos um mundo onde muitos fatores conspiram para agressividade: a competitividade, a insegurança com o futuro, modelos de perfeição que trazem a sensação de fracasso ou injustiça. Te convido a lidar com essa imperfeição, a sua e a do outro. Com-paixão. Vamos nessa?